segunda-feira, março 22, 2010

FACE-OFF




Tenho por princípio para meus comentários no blog não escrever sobre algo que eu não tenha irremediavelmente gostado. Que é que eu diria? “Não gostei. Ponto!” Não sou um crítico de profissão e portanto não me ateria a detalhes técnicos e tal só pra falar de algo. Também não sou um blogueiro por excelência. Até gostaria de ser, mas não tenho tempo, ou desejo de postagens diárias, ainda que elas pudessem ocorrer mais amiúde, diria um desaparecido amigo.
Decidira não escrever sobre Avatar (EUA, 2009), que eu irremediavelmente odiei, mas ao finalmente assistir Guerra ao Terror (The Hunt Locker, EUA, 2009), ponderei que a melhor maneira de falar sobre o filme de Kathryn Bigelow seria comparando-o com o de James Cameron, seu principal concorrente ao Oscar 2010. Faço isso usando os princípios do Big Five: filme, diretor, roteiro, ator e atriz principais.
Um filme precisa ter um roteiro, original, ou adaptado. O resultado vem em grande parte desse roteiro, daí tantos embates, mudanças, exigências da Indústria nesse quesito. Claro que ele deve ser excelente, mas se não for, que seja conciso, coerente, limpo e tenha a propriedade de encantar o público a ponto mesmo de virar um sub-produto do filme, ou levar milhares de pessoas a querer ler o que lhe deu origem. Avatar e Guerra ao Terror têm roteiros simples, sem grandes curvas dramáticas, ou reviravoltas. O segundo, aliás, nem tem reviravoltas. O roteiro de Mark Boal é documental, franco, reflexivo. O roteiro de Cameron é apelativo, maniqueísta e repetitivo.
Cameron deu a cara de Hollywood aos seus personagens: Sam Worthington, um dos atuais queridinhos da Indústria (e que a meu ver ainda não acertou a mão e as escolhas!) e Sigourney Weaver, que tanto já fez Alien, o Oitavo Passageiro, quanto fez Alien, a Ressurreição (!!!); os demais são fantoches unidimensionais, ou personagens virtuais – o povo Na’vi. Interpretações toscas. Guerra aponta em caras novas, exceto as participações especiais e luxuosas de Guy Pierce e Ralph Fiennes (limpando a alma de Lorde Valdemort!). O filme está mesmo nas mãos de Jeremy Renner (Sargento James, concorrente ao Oscar de melhor ator), Anthony Mackie e Brian Geraghty. Seus pequenos e grandes medos, anseios, alegrias, tristezas, uma vida engarrafada nos dias que se escoam perigosos entre o fim de um rodízio e o início de outro. Guerra me ganha porque eu gosto de filmes de gente, suas incoerências, lutas, idiossincrasias (VER ISSO). Aqui os personagens têm uma falha trágica que os humaniza e engrandece. Em Avatar os torna patéticos.
Cameron e Bigelow são excelentes diretores. Rolava nos anos 80 um papo de umas camisetas de equipe onde se lia “Não mexa comigo. Trabalho para Jim Cameron.”. Preciso, inteligente, exigente, detalhista, obstinado. Tudo isso se pode dizer de Cameron e não é a toa que seus filmes são longos (3 horas e meia é demais para os atuais padrões comerciais), caros e levam anos da concepção ao produto. Infelizmente, isso não significa qualidade. O oscarizado e lacrimejante Titanic (sim, eu chorei nele!) e o testoterônico e ecologicamente correto Avatar são duas babas. Dois bolos de noiva com muito glacê e pouca manteiga. Em sua estréia, a primeira mulher a levar um Oscar de melhor direção optou por uma refeição mais simples, balanceada, bem temperada e palatável, não entrando para os clichês sanguinolentos comuns em filmes de guerra; uma violência mais fruto da tensão da cidade (Bagdá), dos seus habitantes (amigos jamais, espiões, submissos?), da vida por um fio de detonador. Seqüências longas e silenciosas que causam uma angústia em quem assiste e dão noção de quanto o tempo – esse inimigo – pode ser ingrato e sufocante.
Filmes pedem uma mão firme. Ambos têm, mas seus objetivos são diametralmente opostos. E não, Kathryn Bigelow não é a ex-senhora James Cameron.
Enquanto filme Avatar é uma embalagem, a forma escolhida por Cameron para vender seu produto. Leia-se a tecnologia para todo o processo de criação da película. E por privilegiar a forma, menosprezou o conteúdo.
Enquanto filme Guerra ao Terror é um veículo, a forma escolhida por Bigelow para questionar a guerra, sobretudo a do Iraque, atravessada na garganta dos americanos, e seus agentes, seja por convicção, vazio, ou obrigação; mas enquanto conteúdo não abriu mão da forma. A seqüência do homem-bomba é fantástica, emocionante e apavorante. Aqui destaco ainda um ponto-chave. Em Guerra os efeitos especiais estão a serviço do roteiro, do filme em si, uma parte importante que soma e dá destaque aquilo que realmente importa, camuflado que está de ocasional. Em Avatar os efeitos especiais premiados com o são o filme. Nesse aspecto Cameron alcançou seus objetivos, mesmo perdendo o Reino dos Céus.
Assistir Guerra ao Terror (esse título é pra induzir alguma coisa na gente?! Afinal, o original faz referência ao trabalho do sargento James e quem sabe sua mania de souvenires de guerra) é uma experiência para ser repetida, multiplicada (não falo em continuações, claro!), discutida. Avatar é acompanhamento de pipoca. Avatar é um filme. Guerra é prosa, poesia, amor e sexo. Fazia tempo que eu precisava ver um filme assim!

Hudson Andrade
18 de março de 2010
10h27

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