sábado, outubro 29, 2011

QUEM COME DESSE PÃO? QUEM BEBE DESSE VINHO?


Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! Pois que sois semelhantes aos sepulcros caiados, que por fora parecem formosos, mas interiormente estão cheios de ossos de mortos e de toda imundícia. Assim, também vós exteriormente pareceis justos aos homens, mas interiormente estais cheios de hipocrisia e de iniqüidade. Mt 23:27-28


Militante do Partido Social Cristão – PSC, afirmou no programa da sua bancada exibido em 27 de outubro de 2011, em rede nacional de rádio e televisão: Nossa prioridade é o ser humano.
No entanto, ao longo de toda a exibição, era visível a discordância com a união civil entre homossexuais, projetos de lei que garantam aos cidadãos gays direitos e deveres iguais a todos, mais proteção contra a violência alheia que ainda grassa e é elemento culturalmente apreciado, incrementado pelos tipos caricatos e infelizes que proliferam em telenovelas, humorísticos e programas em geral.
A questão (ou problema) não é a defesa do modelo patriarcal e heterossexual de união familiar, mas a indicação de que a desordem, a desarmonia entre classes, entre os jovens, a proliferação de vícios e condutas reprováveis é fruto de outras formas de linhagem que não a fórmula apresentada Homem + Mulher + Amor = Família.
Filhos criados por mães e avós, ou tias, reconhecidamente heterossexuais, serão afeminados pela ausência da figura masculina? Daí para a prática homossexual é certeza? Meninas criadas unicamente pelos pais serão masculinizadas, embrutecidas? Grupos onde somente a um dos sexos genéticos é permitida a convivência são celeiros de homossexuais? Ou não há amor entre militares e religiosos? Ou o amor entre iguais, isento de contato sexual e eivado de respeito, não é realmente amor?
Sociedades onde a diferenciação de gêneros sexuais não predominava, desapareceram. Que sociedades? Todo agrupamento tem por objetivo a congregação de seus membros em torno de diretrizes que os organizem, suportem e felicitem. Todo agrupamento é candidato a vitórias. Todo agrupamento é passível de desvirtuamentos e excessos.

Queria falar pela boca de antropólogos, filósofos, neurocientistas, psicólogos e psiquiatras, sociólogos, enfim, tantos que estudam e apresentam de forma franca e factual o fenômeno da homossexualidade como uma das facetas do ser humano, mas não tenho bagagem para isso e tal seria longo e, quiçá, enfadonho.
Falo como cidadão, trabalhador, artista, cristão, brasileiro, tio, primo, filho, irmão, biólogo e também – orgulhosamente – como homossexual: Ama o próximo como a si mesmo. Fazer por eles o que se gostaria para si próprio. Reconciliar-se com o diferente enquanto com ele se caminha. Atirar a primeira pedra apenas se totalmente isento de faltas.
Um partido que tem a marca dos cristãos que morreram nas arenas romanas como símbolo e que ergue sobre si o nome do Cristo,mas não tem caridade pelos seus irmãos – assim chamados por hipocrisia política e tolerância de fachada – não merece crédito.
Nenhum dos seus candidatos receberá o meu voto. É apenas um único voto, mas não é insignificante, porque negar-lhes esse apoio e minha forma de dizer não à mediocridade dos seus ideais.

Oremos pelos que nos perseguem e caluniam.
Bem aventurados somos, porque injuriados.
Quem de nós entrará no Paraíso?

HUDSON ANDRADE
27 de outubro de 2011 AD
22h10

sábado, outubro 08, 2011

MARIA SE MULTIPLICA



“Maria do povo meu.”
(Maria de Nazaré. Pe. Zezinho)


A santinha sempre em seu plástico de fábrica. A madona reluzindo a folhas de ouro.
Maria de barro, Maria de gesso. Maria de cera, de madeira.
A imagem pequenina incrustada no seu manto tão característico. A estátua com sua veste original (que eu sempre achei tão mais bonito!).
A Maria pequenina que vai de casa em casa: “Nossa Senhora vem aqui!”, ou “Hoje a Santa dorme em casa.” O melhor ponto da sala. Base alta. Toalha de renda. Balão de borracha. Flor de plástico. Fita de cetim. vela, que a Santa “não pode dormir no escuro.” Na periferia, no centro, nos condomínios, nas empresas, repartições. A berlinda é uma cesta, uma casa de isopor, uma réplica de arame, um andor de miriti e que vai e de volta a uma igreja de onde parte para uma nova morada – graça sorteada, prêmio ao coração.

E é sempre ela: Maria. Mãezinha. Rainha.

No Domingo os pés têm um só rumo, os olhos só vêem a Berlinda, as mãos todas se erguem ao céu. Toda boca tem um pedido, toda cabeça uma promessa, cada coração uma esperança.
“Ave, Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco. Bendita sois vós entre as mulheres e bendito é o fruto do vosso ventre: Jesus!”
Uma casa, trabalho, saúde. Obrigado! Uma cura, uma prova, um concurso. Obrigada!
Pela minha mãe... os meus irmãos... aquele filho... minha esposa. Todos nós.
“Livrai-nos do fogo do Inferno. Levai as almas todas para o Céu.”

E é sempre ela: Maria. Advogada. Intercessora.

Maria que põe na mesma Corda o homem e a mulher. O que pede e o que agradece. Quem vai por si, ou pelo outro.
“A vós recorremos...”
Estrelas de pólvora transformando o dia numa noite barulhenta.
Aqui se canta: “Ave, ave, ó Senhora da Berlinda...”
Ali se reza: “Ó, Maria concebida sem pecado...” e se pede: “Olhai por nós que recorremos a vós...”

Nesse dia até Deus fica um pouco menor e por ser Deus não dá a isso qualquer importância e brinca com o Cristo sorridente: “Eis aí tua mãe!”
Todos: os Santos nas nuvens, os anjos empoleirados nos ombros paternos, o povo nos galhos das figueiras da Boulevard,nas janelas dos edifícios, esperando nas calçadas. “Ave, Maria.” Todos. “Amém!”

E pato. E maniçoba. E cervejinha. Cervejinha, sim. Não é ela que paga a festa? O cansaço, o sono, o porre.
E tudo sossega.
A vela apaga. Quem se lembra?
Tudo adormece.

Enfim quieta, Maria suspira.
Ajeita o Menino nos braços, confere o bordado do manto.
Sorri.
Amanhã tem mais.
Ô, Glória!

HUDSON ANDRADE
07 de outubro de 2011 AD
14h46