terça-feira, junho 23, 2009

EU 21



Para ler ao som de Cazuza – O Nosso Amor a Gente Inventa:
“O teu amor é uma mentira que a minha vaidade quer. E o meu poesia de cego: você não pode ver. Não pode ver que no meu mundo um troço qualquer morreu. Um corte lento e profundo entre você e eu.”


Passei o dia inteiro meio sonolento. Uma modorra chata de bater cabeça se por dez minutos eu não fizesse algo. Dia quente, suarento, aborrecido. Segunda-feira típica. Quantas vezes tirei o celular do bolso imaginando tê-lo sentido vibrar? Quantas vezes eu ensaiei telefonar e desisti porque era o melhor a ser feito, ainda que a sensação de vazio me apertasse a boca do estômago.
Numa pausa, rabisquei num pedaço usado de papel: Cuida do teu amor que ele é mais frágil do que parece. E lhe dê o tempo apenas necessário e todo o respeito que merece. Daí coloquei isso numa mensagem, fui escolhendo pessoas aleatoriamente e enviando via celular.
Não demorou pra começarem as respostas. Algumas agradecendo, outras perguntando quem eu era que eu não estava em suas agendas; mas o que me chamou a atenção foram as respostas preocupadas, do tipo “o que foi que aconteceu?”. Saudades, eu respondia. Só isso...
Então quando uma velha amiga telefonou, eu não resisti e brinquei que ela relaxasse que aquilo não era um bilhete de suicida. Mas do outro lado ela parecia apreensiva. “Mas por que mandaste essa mensagem pra mim?”. Respondi que sei-lá, que ia escolhendo e mandando. “É que ela tem tudo a ver comigo. Eu tô me separando... tu sabias?”. Não, eu não sabia. E lamentei muitíssimo. Ela e o marido pareciam um casal super feliz. Mas todos parecem afinal, felizes, companheiros, cúmplices. De uma hora pra outra, a realidade: dois estranhos que compartilhavam o mesmo teto, a mesma ilusória vida. “Fico feliz que tenhas me escolhido!”, ela disse. “Obrigada. De coração!”. Fiquei emocionado. Um gesto besta fizera eco em alguém de forma positiva. Isso quase me tranqüilizou. “Mas o que aconteceu contigo?”, ela insistiu. “O que te motivou a escrever isso?”.
Aconteceu tanta coisa, eu pensei. Eu tinha idealizado um amor, um mundo sem curvas, uma vida compartilhada. Medi palavras, escondi coisas, sufoquei caprichos, atendi pedidos, alterei rotinas, tudo em nome de um relacionamento que só existiu na minha cabeça (E a quem eu podia culpar senão a mim mesmo, se é que aqui cabe culpa?!). Respondi firmemente que não tinha acontecido nada, minha linda. Nada! Só saudades. Só isso...
Ela não parecia convencida e disparou: “Mas se quiseres conversar, a gente pode marcar pra se encontrar.”, Respondi que claro que sim. “Bater um papo. Tô à disposição...”. E eu ia respondendo claro, claro, obrigado. Então aquele silêncio. A gente sempre se predispõe afinal, mas sabe que dificilmente vai haver algum encontro. “Bom, amor... tchau!”. Respondi um tchau.
Ao tu-tu-tu do telefone me ocorreu que eu tinha muito que fazer. Tanta coisa. Olhei o relógio. Corri os dedos no teclado.
Então parei. Olhei novamente o relógio e pensei que se eu me organizasse ainda daria tempo pra ir à casa do meu irmão beijar minha sobrinha, ou convidar aquele amigo que queria ver aquele filme pra ir ao cinema comigo, ou ir pra casa mais cedo e fazer o jantar...

Novamente aquela sensação de que não acabou, certo? Mas dessa vez acabou, se é que algum dia começou.

HUDSON ANDRADE
17 de junho de 2009 AD
17h45

6 comentários:

Dona do Diário disse...

Parceria que É parceria não DESUNE!
Quando essa recebi chorei!Por compartilhar de similar momento.

Hudson Andrade disse...

É, Lu. Tem uma música cafonérrima que diz "Por que é que os corações não são iguais?"
Quando li o que escreveste, penso que pelo menos na dor, eles são absolutamente feitos do mesmo estofo. Talvez pra que nos demos as mãos e não soframos tanto.
Não vou beber contigo, mas meu ombro está à disposição!
Beijos!

Sônia Lopes disse...

Amigo eu sei como são essas coisas,"coisas do coração"que depois de algum tempo você aprende a diferença, a sutil diferença entre dar a mão e acorrentar uma alma. E você aprende que amor não significa apoiar-se. E que companhia nem sempre significa segurança. Começa a aprender que beijos não são contratos e que presentes não são promessas. Começa a aceitar suas derrotas com a cabeça erguida e olhos adiante, com a graça de um adulto e não com a tristeza de uma criança.Te amo Hudson,com um amor de mãezona que não quer ver sua cria sofrendo,mais acredito no ser forte que és, e nada melhor para esquecer do que o tempo.Bola prá frente amigo,um dia irás perceber que não era tanto assim.Beijinhos.

Marckson de Moraes disse...

e o que é certo nessa vida?

Hudson Andrade disse...

Certo é o que te faz bem.
No entanto, àz vezes, o que a gente quer e o que nos faz realmente bem não estão no mesmo objeto e ficar sem eles, pra criança que ainda somos, é dolorido!
Obrigado, mano, por passar por aqui!

Anônimo disse...

Amo seus escritos e por isso resolvi compartilhar que eu também possuo um amor de mentira desejado pela minha vaidade.
Mas como escreveste 'certo é o que nos faz bem', e por isso resolvi partilhar que ando descobrindo um bom sabor em degustar amores criados por mim. Aos poucos ele tem se tornado realidade!

Bjus na sua alma artística.