Os quatro últimos filmes que assisti foram X-Men Origens: Wolverine, O Exterminador do Futuro 4: A Salvação, Dúvida e Valsa com Bashir, estes últimos no Líbero Luxardo, do CENTUR. Dúvida num domingo de temporal que foi de impressionar que o cinema, mesmo pequeno, estivesse lotado; Valsa num feriado solitário que doía.
WOLVERINE (X-Men Origins: Wolverine, EUA, 2009) é uma falácia. O roteirista David Banioff e o diretor Gavin Hood vãona cola do sucesso de X-Men, no peso da DC, no carisma do mutante com garras de adamantium. Empatia que é devida a Hugh Jackman e seu carão, costão, peitão, pernão, etc... Mas carisma só não basta para reaver os milhões que o próprio Jackman investiu no filme. Vejam, por exemplo, Russel Crowe. Ele podia ficar feliz com a boca escancarada cheia de dentes com o seu Gladiador e enveredar por continuações e filmes que só mudam o nome sem mudar o enredo, dos quais Hollywood é pródiga. Mas não. Los Angeles – Cidade Proibida, Uma Mente Brilhante e O Informante (mesmo feitos antes de Gladiador) estão aí pra mostrar o contrário, ainda que haja Mestre dos Mares. Mas e Hugh Jackman? A Senha, Van Helsing e agora Wolverine. Caras e bocas, músculos à mostra, testosterona vazando pela tela. História que é bom, nada. Aquelas subversões que sempre ocorrem de uma linguagem para outra, efeitos especiais estonteantes, brecha para um próximo filme e só. Ejaculação sem prazer.
O EXTERMINADOR DO FUTURO 4: A SALVAÇÃO (Terminator Salvation, EUA, 2009) é mais filme. Desses de ação, com todas as idiossincrasias que essa fala carrega quando eu as digo. Machos, mulheres masculinizadas – as não masculinizadas são dadivosas, servis e de grandes olhos lacrimejantes! –, atitudes heróicas, redenção e rajadas de metralhadoras pra matar um Aedes aegypti. Aqui a vaidade de um ator custou ao filme uma maior linearidade e consisão. Christian Bale foi chamado para viver Marcus Wright, personagem que acabou ficando com Sam Worthington. Bale aceitou o trabalho com a condição de viver John Connor, o líder da Resistência contra a Skynet, mas quando leu o roteiro, percebeu que Marcus era o personagem principal e exigiu mais falas e maior visibilidade em cena, o que provocou os tais problemas de linearidade do filme. O que mais se vê é Bale voando, saltando no mar bravio, lutando. “Eu sou John Connor” volta e meia ecoa no filme. Mas não adiantou. Mesmo passando para um próximo filme – e não duvidem que haja um próximo filme!- Connor é menor que Wright e é do condenado à morte que busca uma segunda chance que se vai lembrar. Bale deu um tiro no pé. E falando nisso e em próximo filme, A Salvação, cuja ação se passa em 2018, no apocalíptico futuro apenas sugerido nos filmes anteriores, nos coloca exatamente no ponto em que nos idos de 1984 começava O Exterminador do Futuro, ainda com Arnold Schwarzenegger como o monossilábico T-800 – que agora volta completamente digital, já que o ator não aceitou participar do filme dadas as suas ocupações como governador da Califórnia – e James Cameron – o idealizador de tudo – na direção. Daí ou temos um roteirista inteligente e criativo (?!) ou a desgraça estará feita. E sem um bom roteiro (e talvez até com um!) McG (As Panteras e As Panteras Detonando) não é Cameron e a Resistência terá uma batalha bem maior e mais inglória do que enfrentar T-800s!
DÚVIDA (Doubt, EUA, 2008) é dirigido por John Patrick Shanley, cujo roteiro é uma adaptação da peça teatral de sua autoria, vencedora do Pulitzer e de quatro Tonys, contando agora com cinco indicações para o Oscar. O filme tem um elenco espetacular encabeçado por Meryl Streep e Philip Seymour-Hoffman, protagonistas das melhores sequências de um filme cheio de grandes diálogos, palavras veladas, meias verdades, olhos baixos, enfrentamentos, torneios de força em que o poder está na persuasão enquanto as mãos se ocupam com terços e delicadas xícaras de café.
A irmã Aloysius Beauvier (Streep) é dessas mulheres imbuídas de um objetivo cego do qual não se desvia por mais consistentes sejam as evidências em contrário. Rígida, autoritária, centralizadora, esconde nessa capa de sisudez uma alma fragilizada, cheia de receios e dúvidas. Alertada pela jovem irmã James, vivida pela atriz Amy Adams, natural, numa performance tocante, de um possível assédio contra Donald Miller (o ótimo Joseph Foster),primeiro aluno negro da tradiconal escola St. Nicholas, pelo liberal padre Flynn (Hoffman), a irmã Aloysius inicia uma batalha que vai além de questões raciais, ou sexuais. É uma disputa por poder de alguém que busca uma brecha para se sobressair num 1964 em que ela é constantemente constrangida pelo seu sexo, sua posição na hierarquia religiosa, valores. Destaque para as sequências em que a irmã Aloysius conversa com a mãe do jovem Donald (Viola Davis) cuja linha de raciocínio não cabe no entendimento inflexível da religiosa e no embate final entre Beauvier e o padre Flynn, desses textos que nos pegam tanto pela escrita quanto pela atuação precisa de excelentes atores.
Num filme quase tão silencioso e sombrio quanto os corredores da St. Nicholas, sobram dúvidas: dos personagens, nossas, dos valores de cada um, do que é certo, do que é errado e se há certo e errado. Dúvidas que se espalham como plumas ao vento, impossíveis de serem totalmente resgatadas. Resta-nos manter distância – pretensa isenção –, ou buscar a verdade, custe o que custar.
VALSA COM BASHIR (Val sim Bashir, ISR, ALM, FRA, EUA, FIN, SUI, BEL, AUS, 2008) tem roteiro e direção de Ary Folman. Um semi-documentário de animação que tem como pano de fundo a guerra no Líbano. Bashir é uma referência a Bashir Gemayel, líder miliciano cristão de extrema-direita, opositor de muçulmanos nacionalistas e militantes palestinos, eleito presidente do Líbano e assassinado dois dias antes de tomar posse durante a guerra civil do Líbano, fato que provocou uma violenta cruzada entre os grupos rivais.
Ao ouvir um sonho recorrente do amigo Boaz, parceiro no front, o cineasta Folman percebe que ele mesmo não tem lembranças daquela guerra e decide procurar antigos camaradas e a partir de suas histórias, refazer a sua própria. Misturando recordações e explicações médicas sobre memórias e traumas, Folman vai remontando seu quebra-cabeças, não sem dúvidas, que parecem aumentar a cada nova entrevista, até achar-se no meio de um caos do qual ele tentou fugir seja por culpa, medo, ou simplesmente por não compreender uma guerra que, em essência, não tem explicação.
A narrativa é limpa, linear, objetiva; as histórias se sucedem com crescente intimidade entre quem conta e quem escuta – o que nos inclui. A animação, longe do virtuosismo da Pixar onde grãos de areia e pêlos dançam individualmente ao sabor do vento não é menos impactante. Yoni Goodman utilizou técnicas de animação em Flash, clássicas e 3D para amenizar imagens que, de outra forma, seriam duras demais pra suportar. Como as imagens jornalísticas apresentadas no final do filme e que bem gostaríamos também de apagar e esquecer. Destaque para a sequência inicial, o tal sonho de Boaz, com vinte e seis cães ferozes, e outra, noturna, de uma cidade destruída iluminada por foguetes sinalizadores. De um vigor e uma beleza impressionantes. A trilha sonora de Max Richter é um dos pontos altos de Valsa com Bashir e ouvir “This is Not a Lova Song” dos ingleses do Public Image Ltd. me trouxe umas tantas lembranças e me colocou de alguma maneira dentro daquela busca, por meus particulares anseios.
É muito bom isso de ir atrás de si. Apesar do medo que dá!
HUDSON ANDRADE
12 de junho de 2009 AD
9h00
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