Da cama larga onde eu dormia podia ver pela janela a parede.
Nela um dia eu vi nascer uma dessas plantinhas impertinentes cujas sementes vindas sabem-se Deus de onde, instaladas, insistem em brotar. Esta brotou nas trincas do cimento.
Primeiro eu pensei em arrancá-la, impulso inicial. Depois, em cultivá-la, tomado de paixão pela sua comovente coragem. Por essa mesma coragem decidi deixá-la à própria sorte. Que fizesse por merecer estar ali.
E não é que a danada vingou?! Virou suas folhas pro sol, cresceu na direção na chuva e fincou raízes sabe-se Deus onde.
Um dia inventou de dar flor. Acompanhei aquela gestação com interesse e carinho, borrifando água fria em suas folhas miúdas com um frasquinho de desodorante, espantando formigas com borra de café. Por dias e dias ela ficou ali, dobrando delicadamente as pétalas dentro de um botão verde claro, miúdo e solitário.
Por fim abriu-se a flor, vermelho claro, um pouco laranja, riscada de amarelo por dentro. Quente! Maior do que o botão denunciava e mais bela do que eu jamais imaginara, buscava compensar nas cores detalhadamente distribuídas e nos brilhantes riscos padronizados de suas pétalas a falta de perfume.
Chorei emocionado.
A flor abriu cedo e logo ao final da tarde murchava. Suspirei resignado.
Mas ao olhar pela janela no dia seguinte vi que toda a planta havia morrido, exaurida.
Fechei os olhos por algum momento.
Antes de fechar definitivamente aquela janela depositei o cadáver verde musgo ao meu lado, puxei as cobertas e fechei os olhos.
Um comentário:
As pequenas miudezas da vida representam o íntimo dos sentidos humanos e me arrisco a dizer, o próprio ser humano. Arbitrariamente, dizem alguns, o pensamento é uma decorrência do organismo, o que nos fadaria à eternidade das ilusões... Que bom que uma plantinha pode nos colocar em contato conosco... Agradeço, EU também sinto assim...
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