quarta-feira, maio 21, 2008

BROCARDOS. (2)

Através do Decreto Nº 6.325, de 27 de dezembro de 2007, a ANCINE – Agência Nacional do Cinema estabelece cotas para a exibição de filmes nacionais de longa metragem. Dia desses num jornal, li que algumas empresas preferiam pagar a multa aplicada em caso de não cumprimento do referido decreto do que ocupar suas salas com filmes ruins (no caso citado, Os Poralokinhas – pelo título, já se vê tudo!). Quem pode culpá-los? Distribuidores e exibidoras são, antes de mais nada, empresas. Prestam um serviço e esperam retorno financeiro.

Outras tentativas já aconteceram. Quando do lançamento do filme Dias Melhores Virão (Brasil, 1989), a aposta era na simultaneidade cinema e televisão. Então, numa segunda-feira, a Tela Quente da Globo exibia o filme de Cacá Diegues, uma forma de incentivar as pessoas a vê-lo na tela grande. Alguém aí conhece alguém que foi ao cinema? Alguém aí pelo menos sabia da existência desse filme?

A chamada Cota de Tela lembra muito as outras Cotas do Brasil. A tentativa é louvável: garantir a exibição da produção cinematográfica nacional, mas como toda ação compulsória, esbarra no desconforto e na arbitrariedade. O que deveria garantir a exibição de filmes, qualquer que seja a sua nacionalidade, é sua qualidade. Ninguém pode negar a existência de filmes de extremo bom gosto e refinado senso estético em nossa produção brazuca, desde os feitos pelos glamourizados Walter Salles e Fernando Meireles, passando por pequenas jóias de outros e talentosos diretores e diretoras. Todos têm impresso a alma brasileira e nossos costumes. Existe como uma assinatura auriverde que nem sempre agrada ao público comum. Quantos comentários já não foram feitos sobre “mais um filme sobre a ditadura”? E, no entanto, (quase) ninguém se furta a ver “mais um filme sobre o Vietnã”. Desnecessário dizer que temos muita, mas muita porcaria, filmes de apelo fácil e de humor duvidoso em nada diferentes das imundícies americanas com tortas, pânicos, bichos, bebês e outras sandices envolvendo minorias e sexo. A diferença é que eles têm dinheiro pra gastar e nós não. Além do mais, se percebem que o filme será um fiasco, mandam direto para as locadoras e não ocupam as concorridas salas de projeção com algo sabidamente inviável. Este um exemplo que pode ser seguido!

A defesa que Rodrigo Santoro fez da filmografia brasileira nesta edição do Festival de Cannes é justa, tanto quanto citar produções menores como A Festa da Menina Morta (2008), estréia na direção do talentosíssimo Matheus Nachtergaele, louvando-lhe a qualidade. Pronto, voltamos a ela!

Os investimentos em áudio-visual no país ainda são modestos (estou sendo educado!) – ainda que muito superiores aos investimentos em teatro. Uma vergonha que eu comento depois! –. Não existem empresas (os chamados estúdios) cuja ação seja a de produzir filmes; essa dependência estatal é ridícula e me faz pensar que ainda não saíamos de todo dos regimes opressores de governo. Como esperar alguma coisa que possamos realmente chamar de produção nacional? Daí a criar cotas como paliativo é abusar da minha inteligência. Vá pagar na cabeça de outro!!!

(Só pra constar. Ainda não vi o filme de Nachtegaele. Não sei dizer nada dele além do que li e isso não é muita base para avaliações. Apenas confio no seu trabalho.)

Hudson Andrade

Belém, Pará, 21 de maio de 2008 AD

12h25

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